No Outono de Minha Existência

O dia nasce nublado, diferente do que era esperado La Valse D'Amelie toca em aleatório, ecoando nas paredes de meu pequeno quarto. O som das teclas do piano, combinadas com o som da chuva que cai lá fora, trazem memórias de lugares imaginários... Memórias de noites etéreas que não tenho certeza se por mim foram vividas. Lembro-me que, assim como as flores de meu jardim, os dias se transformam rapidamente; O sol correu pelo céu, mudando a posição dos desenhos que as sombras faziam em meu rosto; e o vento balançou meus cabelos que cresceram sem que eu percebesse. Paisagens passam lentamente na escura tela de minha mente, mostrando-me sorrisos, abraços e folhas que se desprendem de seus galhos e caem, assim como as lembranças ruins que costumavam brincar comigo. Efêmeras. O cheiro do chá de camomila que me esqueci de estar preparando inunda minhas narinas acordando-me de deus devaneios; A realidade parece diferente, fugaz e modificada. Sinto-me, então, preparada Para ...

Vivia no inverno de minha existência: Tocava as paredes frias e Por detrás da névoa que cobria meus olhos Percebia o esvair de meus sonhos falidos. Certo dia, então, o verão chegou Intenso e fugaz Trouxe consigo acontecimentos singulares: o vento que sopra do leste; o cheiro que surge antes da chuva; a brisa quente que toca o mar; É  o desaguar de nossos rios inaufragáveis... o desandar de nossos caminhos ermos. É derradeiro e infinito. É o sumiço e a morte de nosso horizonte invisível. É o fim do que não começou.

Um dia, o jardim que nutria, amanheceu danificado: Ervas daninhas, ninhos desfeitos, canteiros quebrados. No meio desse nada, um brilho surgiu e fez-me esquecer de tudo A harmonia me envolveu como o som de arpas tocando em meus ouvidos; como a sensação de cordas deslizando sob meus dedos; como ondas dançando em pleno ar. Através dos galhos, então, pude notar: Era possível ver minha imagem em teu olhar. Você me tocou, sem nem mesmo precisar me tocar.